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O primeiro cometa interestelar pode ser o mais puro já encontrado

O primeiro cometa interestelar pode ser o mais puro já encontrado

Data de Publicação: 30 de março de 2021 12:49:00 Por: Marcello Franciolle

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Novas observações obtidas com o Very Large Telescope (VLT) do ESO indicam que o cometa 2I/Borisov, o segundo e mais recente visitante interestelar detectado no nosso Sistema Solar, é um dos mais primitivos já observados. Os astrônomos suspeitam que o cometa provavelmente nunca passou perto de uma estrela, tornando-o uma relíquia intacta da nuvem de gás e poeira da qual se formou.

 

Crédito: ESO/O. Hainaut

 

O cometa 2I/Borisov foi descoberto pelo astrônomo amador Gennady Borisov em agosto de 2019, tendo-se confirmado que este objeto vinha de fora do Sistema Solar algumas semanas mais tarde. “O 2I/Borisov pode representar o primeiro cometa verdadeiramente intocado já observado”, disse Stefano Bagnulo do Observatório e Planetário Armagh, Irlanda do Norte, Reino Unido, que liderou o novo estudo publicado hoje na revista Nature Communications. A equipe acredita que o cometa nunca passou perto de nenhuma estrela antes de passar pelo Sol em 2019.

Bagnulo e colegas usaram o instrumento FORS2 montado no Very Large Telescope (VLT) do ESO, no norte do Chile, para estudar o 2I/Borisov em detalhes, através de uma técnica chamada polarimetria [1]. Uma vez que esta técnica é regularmente usada para estudar cometas e outros pequenos corpos do nosso Sistema Solar, isso permitiu que a equipe comparasse o visitante interestelar com nossos cometas locais.

A equipe descobriu que o cometa 2I/Borisov tem propriedades polarimétricas distintas das dos cometas do Sistema Solar, com exceção do Hale-Bopp. O cometa Hale-Bopp despertou grande interesse no público no final dos anos 1990, por ser facilmente visível a olho nu e também por ser um dos cometas mais puros que os astrônomos já viram. Antes da sua mais recente passagem pelo Sol observada por nós, acredita-se que o Hale-Bopp tenha passado perto do nosso Sol apenas uma vez e, portanto, quase não foi afetado pelo vento solar e pela radiação, tratando-se por isso de um cometa bastante puro, com uma composição muito semelhante à nuvem de gás e poeira que lhe deu origem (assim como ao resto do Sistema Solar) há cerca de 4,5 bilhões de anos.

Ao analisar a polarização juntamente com a cor do cometa para aprender mais sobre a sua composição, a equipe concluiu que o 2I/Borisov é, na realidade, ainda mais puro que o Hale-Bopp, o que significa que traz consigo assinaturas imaculadas da nuvem de gás e poeira a partir da qual se formou.

O fato dos dois cometas serem notavelmente semelhantes sugere que o meio que deu origem ao 2I/Borisov não é assim tão diferente, em termos de composição, do meio do Sistema Solar primordial”, explicou Alberto Cellino, um dos co-autores do estudo do Observatório Astrofísico de Torino, Instituto Nacional de Astrofísica (INAF), Itália.

 

Olivier Hainaut, astrônomo do ESO na Alemanha que estuda cometas e outros objetos próximos da Terra, mas que não esteve envolvido neste novo estudo, concorda. “O resultado principal - que o cometa 2I/Borisov não é igual a nenhum outro cometa excepto o Hale-Bopp - é bastante forte”, diz Hainaut, acrescentando que “é muito plausível que ambos os cometas tenham se formado em condições muito semelhantes”.

A chegada do 2I/Borisov do espaço interestelar nos deu a primeira oportunidade para estudar a composição de um cometa de outro sistema planetário e verificar que o material desde cometa é de algum modo diferente da nossa variedade local”, explica Ludmilla Kolokolova, da Universidade de Maryland, EUA, que esteve envolvida neste trabalho.

Bagnulo espera que os astrônomos tenham outra oportunidade, ainda melhor, de estudar um cometa deste tipo antes do final desta década. “A ESA está planejando o lançamento do Comet Interceptor em 2029, o qual terá a capacidade de chegar a outro visitante interestelar, se se descobrir um em uma trajetória adequada”, explica Bagnulo, referindo-se a uma futura missão da Agência Espacial Europeia.


Uma história de origem escondida na poeira

Mesmo sem uma missão espacial, os astrônomos podem usar os muitos telescópios colocados no solo terrestre para aprenderem mais sobre as diferentes propriedades dos cometas exteriores ao Sistema Solar como o 2I/Borisov. “Imagine a sorte que tivemos que um cometa de um sistema a anos-luz de distância simplesmente fez uma viagem até nossa porta por acaso”, disse Bin Yang, astrônoma do ESO no Chile, que também aproveitou a passagem do 2I/Borisov pelo Sistema Solar para estudar este misterioso cometa. Os resultados da sua equipe foram publicados na revista Nature Astronomy.

Yang e a sua equipe usaram dados do Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA), do qual o ESO é um parceiro, assim como o VLT do ESO, para estudarem os grãos de poeira do 2I/Borisov com o intuito de saberem mais sobre o nascimento do cometa e as condições presentes no seu sistema.

A equipe descobriu que a coma do 2I/Borisov, um envelope de poeira que rodeia o corpo principal do cometa contém pedrinhas compactas, grãos com cerca de um milímetro ou mais de tamanho. Além disso, a equipe descobriu que as quantidades relativas de monóxido de carbono e água no cometa mudaram drasticamente à medida que ele se aproximou do Sol. A equipe, que também inclui Olivier Hainaut, explica que este fato indica que o cometa é constituído por materiais que se formaram em diferentes locais do seu sistema planetário.

As observações de Yang e colegas sugerem que a matéria existente no sistema planetário de origem do 2I/Borisov se encontrava misturada, quando da formação do cometa, desde as zonas próximas da sua estrela até às mais afastadas. Uma explicação seria a existência de planetas gigantes cuja forte gravidade agita o material no sistema. Os astrônomos acreditam que um processo similar tenha ocorrido nas fases iniciais do nosso próprio Sistema Solar.

Apesar do 2I/Borisov ter sido o primeiro cometa vindo de fora do Sistema Solar a passar pelo Sol, não foi o primeiro visitante interestelar. O primeiro objeto interestelar que vimos passar pelo Sistema Solar foi o ‘Oumuamua, outro objeto estudado com o auxílio do VLT em 2017. Originalmente classificado como cometa, o ‘Oumuamua foi mais tarde reclassificado como asteroide já que não possuía uma coma cometária.

Notas

[1] A polarimetria é uma técnica que permite medir a polarização da luz. A luz se torna polarizada quando passa através de certos filtros, como por exemplo as lentes de óculos de sol polarizados ou materiais cometários. Ao estudar as propriedades da luz solar polarizada pela poeira de um cometa, os cientistas podem aprender mais sobre a física e química destes objetos.

 


- Este texto é a tradução da Nota de Imprensa do ESO eso2106, cortesia do ESON, uma rede de pessoas nos Países Membros do ESO, que servem como pontos de contato local para a imprensa. O representante brasileiro é Eugênio Reis Neto, do Observatório Nacional/MCTIC. A nota de imprensa foi traduzida por Margarida Serote (Portugal) e adaptada para o português brasileiro por Eugênio Reis Neto.

Mais Informações:

Esta pesquisa destacada na primeira parte deste comunicado foi apresentada no artigo “Unusual polarimetric properties for interstellar comet 2I/Borisov” que será publicado na revista Nature Communications (doi: 10.1038/s41467-021-22000-x).

A segunda parte do comunicado destaca o estudo “Compact pebbles and the evolution of volatiles in the interstellar comet 2I/Borisov” que será publicado na revista Nature Astronomy (doi: 10.1038/s41550-021-01336-w).

Fonte: ESO

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