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Qual é a velocidade da gravidade, exatamente?

Qual é a velocidade da gravidade, exatamente?

Data de Publicação: 12 de março de 2023 11:27:00 Por: Marcello Franciolle

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Graças às observações das ondas gravitacionais, os cientistas conseguiram resolver um debate de longa data sobre a velocidade da gravidade

Crédito da imagem: catalin/Adobe Stock

 

Ao longo da história, os cientistas propuseram muitas respostas para a velocidade exata da gravidade. De um modo geral, as duas proposições principais foram que a gravidade é infinitamente rápida ou tão rápida quanto a velocidade da luz.

Graças às observações de ondas gravitacionais registradas em 2017, agora sabemos que a gravidade e a luz viajam na mesma velocidade.

De todas as forças fundamentais conhecidas pela humanidade, a gravidade é a mais familiar e a que mantém o Universo unido, conectando galáxias distantes em uma vasta e interconectada teia cósmica. Com isso em mente, uma questão fascinante a se ponderar é se a gravidade tem uma velocidade. Acontece que sim, e os cientistas a mediram com precisão.

Vamos começar com um experimento mental. Suponha que neste exato instante, de alguma forma, o Sol foi feito para desaparecer, não apenas escurecer, mas desaparecer completamente. Sabemos que a luz viaja a uma velocidade fixa: 300.000 quilômetros por segundo, ou 186.000 milhas por segundo. A partir da distância conhecida entre a Terra e o Sol (150 milhões de quilômetros, ou 93 milhões de milhas), podemos calcular quanto tempo levaria até que nós aqui na Terra soubéssemos que o Sol haveria desaparecido. Levaria cerca de oito minutos e 20 segundos antes que o céu do meio-dia escurecesse.

Mas, e a gravidade? Se o sol desaparecesse, não só deixaria de emitir luz, como também deixaria de exercer a gravidade que mantém os planetas em órbita. Quando descobriríamos?  

Se a gravidade é infinitamente rápida, a gravidade também desapareceria assim que o Sol se tornasse inexistente. Ainda veríamos o Sol por pouco mais de oito minutos, mas a Terra já começaria a vagar rumo ao espaço interestelar. Por outro lado, se a gravidade viajasse à velocidade da luz, nosso planeta continuaria a orbitar o Sol normalmente por oito minutos e 20 segundos, após o que pararia de seguir seu caminho familiar.

É claro que, se a gravidade viajasse em alguma outra velocidade, o intervalo entre o momento em que os adoradores do Sol percebessem que o Sol haveria sumido e o momento em que os astrônomos observaram que a Terra estaria indo na direção errada seria diferente. Então, qual é a velocidade da gravidade?

Diferentes respostas têm sido propostas ao longo da história científica. Sir Isaac Newton, que inventou a primeira teoria sofisticada da gravidade, acreditava que a velocidade da gravidade era infinita. Ele teria previsto que o caminho da Terra através do espaço mudaria antes que os humanos ligados à Terra percebessem que o Sol havia desaparecido.

Por outro lado, Albert Einstein acreditava que a gravidade viajava na velocidade da luz. Ele teria previsto que os humanos notariam simultaneamente o desaparecimento do Sol e a mudança do caminho da Terra através do cosmos. Ele construiu essa suposição em sua teoria da relatividade geral, que atualmente é a teoria da gravidade mais bem aceita, e prevê com muita precisão o caminho dos planetas ao redor do Sol. Sua teoria faz previsões mais precisas do que a de Newton. Então, podemos concluir que Einstein estava certo?

Não, não podemos. Se quisermos medir a velocidade da gravidade, precisamos pensar em uma maneira de medi-la diretamente. E, claro, como não podemos simplesmente “desaparecer” o Sol por alguns instantes para testar a ideia de Einstein, precisamos encontrar outra maneira.

A teoria da gravidade de Einstein fez previsões testáveis. A mais importante é que ele percebeu que a gravidade familiar que experimentamos pode ser explicada como uma distorção do tecido do espaço: Quanto maior a distorção, maior a gravidade. E essa ideia tem consequências significativas. Sugere que o espaço é maleável, semelhante à superfície de um tecido elástico, que se distorce quando uma criança pisa nele. Além disso, se essa mesma criança pular no trampolim, a superfície muda: Ela salta para cima e para baixo.

Da mesma forma, o espaço pode metaforicamente “saltar para cima e para baixo”, embora seja mais correto dizer que ele se comprime e relaxa de maneira semelhante à forma como o ar transmite ondas sonoras. Essas distorções espaciais são chamadas de “ondas gravitacionais” e viajam na velocidade da gravidade. Então, se pudermos detectar ondas gravitacionais, talvez possamos medir a velocidade da gravidade. Mas distorcer o espaço de maneira que os cientistas possam medir é bastante difícil e está muito além da tecnologia atual. Felizmente, a natureza nos ajudou.

MEDINDO ONDAS GRAVITACIONAIS

Um técnico trabalhando em algumas das ópticas de um detector do Observatório de Ondas Gravitacionais por Interferômetro a Laser. Crédito da imagem: Laboratório LIGO

 

No espaço, os planetas orbitam as estrelas. Mas às vezes as estrelas orbitam outras estrelas. Algumas dessas estrelas já foram massivas e viveram suas vidas e morreram, deixando um buraco negro, o cadáver de uma estrela massiva morta. Se duas dessas estrelas morrerem, então você pode ter dois buracos negros orbitando um ao outro. À medida que orbitam, emitem minúsculas (e atualmente indetectáveis) quantidades de radiação gravitacional, o que os fazem perder energia e se aproximar um do outro. Eventualmente, os dois buracos negros se aproximam o suficiente para se fundirem. Este violento processo libera enormes quantidades de ondas gravitacionais. Na fração de segundo em que os dois buracos negros se juntam, a fusão libera mais energia em ondas gravitacionais do que toda a luz emitida por todas as estrelas do universo observável durante o mesmo tempo.

Embora a radiação gravitacional tenha sido prevista em 1916, os cientistas levaram quase um século para desenvolver a tecnologia para detectá-la. Para detectar essas distorções, os cientistas pegam dois tubos, cada um com cerca de 4 quilômetros de comprimento, e os orientaram em 90 graus, de modo que formem um “L”. Eles então usam uma combinação de espelhos e lasers para medir o comprimento de ambos os tubos. A radiação gravitacional mudará o comprimento dos dois tubos de maneira diferente e, se eles virem o padrão correto de mudanças de comprimento, observaram ondas gravitacionais.

Assista a essa animação para ver como funciona a detecção das ondas gravitacionais pelo LIGO. Crédito da animação: https://spaceplace.nasa.gov/gravitational-waves/en/

 

primeira observação de ondas gravitacionais ocorreu em 2015, quando dois buracos negros localizados a mais de 1 bilhão de anos-luz da Terra se fundiram. Embora este tenha sido um momento muito emocionante na astronomia, não respondeu à questão da velocidade da gravidade. Para isso, foi necessária uma observação diferente.

Embora ondas gravitacionais sejam emitidas quando dois buracos negros colidem, essa não é a única causa possível. Ondas gravitacionais também são emitidas quando duas estrelas de nêutrons se chocam. Estrelas de nêutrons são os restos de estrelas gigantes que experimentaram o final de suas vidas em uma explosão ardente conhecida como supernova, como mencionado anteriormente em Gaia Ciência Semelhantes aos buracos negros, mas um pouco mais leves. Além disso, quando as estrelas de nêutrons colidem, elas não apenas emitem radiação gravitacional, mas também emitem uma poderosa explosão de luz que pode ser vista em todo o Universo. Para determinar a velocidade da gravidade, os cientistas precisavam ver a fusão de duas estrelas de nêutrons.

Em 2017, os astrônomos tiveram sua chance. Eles detectaram uma onda gravitacional e, pouco mais de dois segundos depois, observatórios orbitais detectaram radiação gama, que é uma forma de luz, do mesmo local no espaço com origem em uma galáxia localizada a 130 milhões de anos-luz de distância. Finalmente, os astrônomos encontraram o que precisavam para determinar a velocidade da gravidade.

A fusão de duas estrelas de nêutrons emite ondas de luz e gravitacionais ao mesmo tempo, portanto, se a gravidade e a luz tiverem a mesma velocidade, elas devem ser detectadas na Terra ao mesmo tempo. Dada a distância da galáxia que abrigava essas duas estrelas de nêutrons, sabemos que os dois tipos de ondas viajaram por cerca de 130 milhões de anos e chegaram com dois segundos de diferença uma da outra.  

Então, essa é a resposta. A gravidade e a luz viajam na mesma velocidade, determinada por uma medição precisa. Ela valida Einstein mais uma vez e sugere algo profundo sobre a natureza do espaço. Os cientistas esperam um dia entender completamente por que esses dois fenômenos tão diferentes têm velocidades idênticas.

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Referência:

LINCOLN, Dom. How fast is gravity, exactly? Big Think, 24, out. 2022. Disponível em: <https://bigthink.com/hard-science/speed-of-gravity/?utm_term=Autofeed&utm_medium=Social&utm_source=Facebook&fbclid=IwAR29GC39z-lWOeCsy7U1vW_mqZ-7zKXWykFTsp8qPvbQUeKQlw9Kjk3HcPQ#Echobox=1672031693>. Acesso em: 10, fev. 2023.


Marcello Franciolle F T I P E
Founder - Gaia Ciência

Marcello é fundador da Gaia Ciência, que é um periódico científico que foi pensado para ser uma ferramenta para entender o universo e o mundo em que vivemos, com temas candentes e fascinantes sobre o Universo e Ciências da Terra para inspirar e encantar as pessoas. Ele é graduando em Administração pelo Centro Universitário N. Sra. do Patrocínio (CEUNSP) – frequentou a Universidade de Sorocaba (UNISO); graduação em Análise de Sistemas e onde participou do Encontro de Pesquisadores e Iniciação Científica (EPIC). Suas paixões são literatura, filosofia, poesia e claro ciência. 

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