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Bóson de Higgs: A 'partícula de Deus' explicada

Bóson de Higgs: A 'partícula de Deus' explicada

Data de Publicação: 16 de março de 2022 20:03:00 Por: Marcello Franciolle

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A existência do bóson de Higgs completa o modelo padrão da física de partículas

Ilustração artística do bóson de Higgs sendo produzido por dois prótons em colisão. Crédito da imagem: MARK GARLICK/SCIENCE PHOTO LIBRARY via Getty Images

 

O bóson de Higgs é a partícula portadora da força fundamental do campo de Higgs, que é responsável por conceder massa a outras partículas. Este campo foi proposto pela primeira vez em meados dos anos sessenta por Peter Higgs, para quem a partícula é nomeada e seus colegas.

A partícula foi finalmente descoberta em 4 de julho de 2012, por pesquisadores do Grande Colisor de Hádrons (LHC), o acelerador de partículas mais poderoso do mundo, localizado no laboratório europeu de física de partículas do CERN, na Suíça.

O LHC confirmou a existência do campo de Higgs e do mecanismo que dá origem à massa e assim completou o modelo padrão da física de partículas, a melhor descrição que temos do mundo subatômico.

À medida que os cientistas se aproximavam do final do século 20, os avanços na física de partículas responderam a muitas perguntas que cercavam os blocos de construção fundamentais da natureza. No entanto, à medida que os físicos povoavam constantemente o zoológico de partículas com elétrons, prótons, bósons e todos os tipos de quarks, algumas questões prementes permaneciam teimosamente sem resposta. Entre elas, por que algumas partículas têm massa?

A história do bóson de Higgs é motivada por essa questão.

O QUE É O BÓSON DE HIGGS?

O bóson de Higgs tem uma massa de 125 bilhões de elétron-volts, o que significa que é 130 vezes mais massivo que um próton, de acordo com o CERN. Também não possui carga com rotação zero, um equivalente a mecânica quântica ao momento angular. O bóson de Higgs é a única partícula elementar sem spin.

Um bóson é uma partícula "portadora de força" que entra em ação quando as partículas interagem umas com as outras, com um bóson trocado durante essa interação. Por exemplo, quando dois elétrons interagem, eles trocam um fóton, a partícula portadora de força dos campos eletromagnéticos.

Como a teoria quântica de campos descreve o mundo microscópico e os campos quânticos que preenchem o universo com a mecânica ondulatória, um bóson também pode ser descrito como uma onda em um campo. 

Assim, um fóton é uma partícula e uma onda que surge de um campo eletromagnético excitado e o bóson de Higgs é a partícula ou "manifestação quantizada" que surge do campo de Higgs quando excitado. Esse campo gera massa por meio de sua interação com outras partículas e o mecanismo transportado pelo bóson de Higgs chamado mecanismo de Brout-Englert-Higgs.

POR QUE O BÓSON DE HIGGS É CHAMADO DE 'PARTÍCULA DE DEUS?'

O detector ATLAS (A Toroidal LHC Apparatus) é um dos detectores de uso geral do LHC. O ATLAS, juntamente com o detector CMS, detectou pela primeira vez o bóson de Higgs. Crédito da imagem: xenotar via Getty Images

 

O apelido do bóson de Higgs "a partícula de Deus" foi solidificado após sua descoberta, principalmente como resultado da mídia popular. A origem disso é muitas vezes ligada ao físico vencedor do Prêmio Nobel Leon Lederman, referindo-se ao bóson de Higgs como a "Partícula Maldita" em frustração com a dificuldade de detectar.

O Business Insider diz que quando Lederman escreveu um livro sobre o bóson de Higgs na década de 1990 o título seria "A Partícula Maldita", mas os editores mudaram para "A Partícula de Deus" e uma conexão problemática com a religião foi traçada, o que incomoda os físicos até hoje. 

Ainda assim, é difícil superestimar a importância do bóson de Higgs e do campo de Higgs em geral, pois sem esse aspecto da natureza nenhuma partícula teria massa. Isso significa que não há estrelas, planetas e nós, algo que pode ajudar a justificar seu apelido hiperbólico. 

POR QUE O BÓSON DE HIGGS É IMPORTANTE?

Em 1964, os pesquisadores começaram a usar a teoria quântica de campos para estudar a força nuclear fraca, que determina o decaimento atômico dos elementos transformando prótons em nêutrons, e sua força carrega os bósons W e Z.

Os portadores de força fracas não deveriam ter massa e, se não tivessem, isso arriscaria quebrar um princípio da natureza chamado simetria que, assim como a simetria de uma forma garante que ela pareça a mesma se for girada ou invertida, garante que as leis da natureza sejam as mesmas, independentemente de como são vistas. Colocar massa arbitrariamente em partículas também fez com que certas previsões tendessem ao infinito.

No entanto, os pesquisadores sabiam que, como a força fraca é tão forte em interações de curta distância, muito mais poderosa que a gravidade, mas muito fraca em interações mais longas, seus bósons devem ter massa.

A solução proposta por Peter Higgs François Englert e Robert Brout, em 1964, foi um novo campo e uma maneira de "enganar" a natureza para quebrar a simetria espontaneamente.

Um artigo do CERN compara isso a um lápis parado sobre sua ponta, um sistema simétrico, de repente inclinando-se para apontar em uma direção preferida, destruindo sua simetria. Higgs e seu colega físico propuseram que, quando o universo nasceu, ele foi preenchido com o campo de Higgs em um estado simétrico, mas instável, como o lápis precariamente equilibrado. 

O campo rapidamente, em apenas frações de segundo, encontra uma configuração estável, mas isso no processo quebra sua simetria. Isso dá origem ao mecanismo de Brout-Englert-Higgs que concede massa aos bósons W e Z.

O que mais tarde foi descoberto sobre o campo de Higgs foi que ele não apenas daria massa aos bósons W e Z, mas também concederia massa a muitas outras partículas fundamentais. Sem o campo de Higgs e o mecanismo de Brout-Englert-Higgs, todas as partículas fundamentais correriam ao redor do universo na velocidade da luz. Essa teoria não apenas explica por que as partículas têm massa, mas também por que elas têm massas diferentes.

Partículas que interagem, ou "casais", com o campo de Higgs mais fortemente recebem massas maiores. Mesmo o próprio bóson de Higgs obtém sua massa de sua própria interação com o campo de Higgs. Isso foi confirmado observando como as partículas do bóson de Higgs decaem. 

Uma partícula que não recebeu massa pelo campo de Higgs é a partícula básica de luz, o fóton. Isso ocorre porque a quebra espontânea de simetria não acontece para os fótons, como acontece com suas partículas portadoras de força, os bósons W e Z.

Esse fenômeno de concessão de massa também se aplica apenas a partículas fundamentais como elétrons e quarks. Partículas como prótons, compostas de quarks, obtêm a maior parte de sua massa da energia de ligação que mantém seus constituintes juntos.

Embora tudo isso esteja de acordo com a teoria, o próximo passo foi descobrir evidências do campo de Higgs detectando sua partícula portadora de força. Fazer isso não seria uma tarefa simples, na verdade, exigiria o maior experimento e a máquina mais sofisticada da história humana. 

Desta forma, a busca pelo próprio bóson de Higgs levou a tecnologia de acelerador de partículas e detector ao seu limite, com a expressão máxima disso sendo o Grande Colisor de Hádrons (LHC).

A DESCOBERTA DO BÓSON DE HIGGS E O MODELO PADRÃO

O modelo padrão da física de partículas e os ocupantes do zoológico de partículas completado pelo bóson de Higgs que concede massa à maioria deles. Crédito da imagem: Cush/Wikimedia Commons

 

Detectar o bóson de Higgs não é apenas uma questão de montar um detector e esperar que ele apareça. Essas partículas só existiam nas condições de alta energia do universo primitivo.

Isso significa que antes de detectar essa partícula, essas condições de alta energia precisam ser replicadas e os bósons de Higgs precisam ser criados. O LHC faz isso acelerando prótons até a velocidade da luz e esmagando-os.

Isso cria uma cascata de partículas que rapidamente se decompõem em partículas mais leves. O bóson de Higgs decai muito rapidamente para ser detectado e, ao invés disso, foi identificado pela detecção de decaimentos de partículas que indicavam uma partícula sem spin e previsões teóricas correspondentes para esse bóson ausente. 

A partícula foi detectada tanto pelo detector LHC ATLAS quanto pelo detector Solenóide de Múon Compacto (CMS). 

O anúncio da detecção do bóson de Higgs foi feito no CERN em Genebra em 4 de julho de 2012. Demorou até março do ano seguinte para confirmar que a partícula detectada era de fato o bóson de Higgs. 

Ao revelar esta partícula, prevista pelo modelo padrão, a descoberta do bóson de Higgs completou este quadro do mundo subatômico. Ainda existem mistérios além dessa teoria, como a natureza da matéria escura que o bóson de Higgs, por meio de suas propriedades únicas, poderia ajudar a resolver.

O BÓSON DE HIGGS APÓS 2012

No ano seguinte à descoberta do bóson de Higgs, Peter Higgs e François Englert receberam o Prêmio Nobel de Física de 2013, por sua teoria do campo de Higgs. 

Comitê do Nobel escreveu sobre o prêmio: "pela descoberta teórica de um mecanismo que contribui para nossa compreensão da origem da massa de partículas subatômicas, e que recentemente foi confirmado pela descoberta da partícula fundamental prevista, pelos experimentos ATLAS e CMS no CERN's Grande Colisor de Hádrons".

A descoberta do bóson de Higgs pode ter completado o modelo padrão, mas este não foi o fim da investigação desta partícula indescritível. Uma das principais descobertas feitas desde 2012 envolveu a confirmação do decaimento do Higgs. 

E a investigação desta partícula indescritível se aprofundará durante a execução 3 do LHC e particularmente quando a atualização de alta luminosidade do acelerador de partículas for concluída em 2029.

Isso permitirá que o LHC conduza mais colisões, proporcionando aos pesquisadores mais oportunidades para detectar física exótica, incluindo fenômenos além do modelo padrão. 

O CERN estima que, após a atualização a cada ano, o acelerador criará 15 milhões dessas partículas. Isso é comparado a 3 milhões de bósons de Higgs criados pelo LHC em 2017. Isso pode ser a chave para detectar outros "sabores" do bóson de Higgs.

As teorias que vão além do modelo padrão da física de partículas também preveem até cinco tipos diferentes de bósons de Higgs que podem ser produzidos com menos frequência do que o bóson de Higgs primário. Mesmo antes das atualizações, os cientistas já nos forneceram evidências tentadoras de um "bóson de Higgs magnético". 

♦ Todos os artigos baseados em tópicos são determinados por verificadores de fatos como corretos e relevantes no momento da publicação. Texto e imagens podem ser alterados, removidos ou adicionados como uma decisão editorial para manter as informações atualizadas.

LEITURA ADICIONAL

  • A descoberta do bóson de Higgs completou o que é conhecido como o modelo padrão da física de partículas. O CERN explica o que essa estrutura nos diz sobre o mundo subatômico. 
  • Saiba mais sobre o bóson de Higgs com este artigo do Departamento de Energia dos EUA
  • Explore algumas perguntas frequentes sobre o bóson de Higgs com o CERN.

 

BIBLIOGRAFIA

 

— Este artigo foi atualizado em 11 de julho de 2022 pelo editor da Gaia Ciência.

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Referência:

LEA, Robert. Higgs boson: The 'God Particle' explained. Space, Nova York, 30, jun. 2022. References. Disponível em: <https://www.space.com/higgs-boson-god-particle-explained>. Acesso em: 11, jul. 2022.


Marcello Franciolle F T I P E
Founder - Gaia Ciência

Marcello é fundador da Gaia Ciência, que é um periódico científico que foi pensado para ser uma ferramenta para entender o universo e o mundo em que vivemos, com temas candentes e fascinantes sobre o Universo e Ciências da Terra para inspirar e encantar as pessoas. Ele é graduando em Administração pelo Centro Universitário N. Sra. do Patrocínio (CEUNSP) – frequentou a Universidade de Sorocaba (UNISO); graduação em Análise de Sistemas e onde participou do Encontro de Pesquisadores e Iniciação Científica (EPIC). Suas paixões são literatura, filosofia, poesia e claro ciência. 

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